A mídia que não precisamos

22:10

Por Priscila Gama


Estamos contemplando um fenômeno preocupante, o crescimento da onda de violência em pequenas e médias cidades. Assaltos, homicídios, furtos, entre outras ações estão se tornando rotina em cidades antes tranqüilas.


Imperatriz há tempos deixou de ser uma cidade pacata. Aliás, dados históricos comprovam uma pré-disposição à violência desde a sua fundação, marcada pelo crime da pistolagem. Dentre os fatores determinantes desse quadro, podemos citar a falta de uma política pública de segurança. Outros mais céticos apostam na falta de política de assistência pública e o aumento de fatores como o desemprego.


Na verdade, o que endossa tal situação é o crescimento vertiginoso de uma onda de incredulidade, de valores, oportunidades, e por que não falar, de educação, mais precisamente a educação que a mídia dá. Até bem pouco tempo atrás, a pobreza era apresentada na mídia como causa do crime. Essa idéia mudou em partes, e hoje ela é um marcador de risco.


É comum a mídia atrelar violência também a territórios, denominando alguns bairros periféricos como “fábrica de violência”. Diante deste fator, é cada vez mais comum encontrar nas TV’s e jornais conteúdo sensacionalista. Alguns programas têm como intuito informar as pessoas sobre fatos que provoquem comoção, como assaltos, mortes, acidentes automobilísticos e estupros. No entanto, pesquisas acadêmicas sobre a veiculação da violência nos meios de comunicação apontam para uma dramaticidade exagerada e para uma manipulação da informação.


Institutos de opinião atestam que esse tipo de programa cresce na preferência popular. São muito assistidos pelas classes baixas, que encontram na tela, signos comuns à dura realidade a que estão sujeitas. A receita de sucesso é tão certa que até mesmo as grandes emissoras nacionais arriscaram programas do tipo. Mas o formato enxuto e novelístico dos mesmos, não agradou ao público, “acostumado” a ver a violência nua e crua, sem cortes.


Os programas de TV que se dedicam exclusivamente à veiculação da violência urbana em Imperatriz têm atingido altos índices de audiência. Bandeira 2 (Difusora) e De olho em você (Band) são os mais assistidos. O sucesso é tão grande que a sociedade acaba recorrendo primeiramente a estes programas quando um crime ou acidente acontece. É comum ouvirmos “Chama o Bandeira 2!”, demonstrando o poder de manipulação dos mesmos. Os apresentadores, com áurea de heróis, acabam ganhando prestígio diante do público, e uma carreira política começa a se esboçar.


Entretanto, o conteúdo nocivo desses programas afeta a opinião pública e acaba por gerar uma necessidade no cidadão de “ver sangue”. A mídia, como fundamentadora de estereótipos e preconceitos, acaba acirrando o clima de violência entre a sociedade.


“O Bandeira 2 é meu café da manhã”, disse o jovem Jaírton de Sousa, 28. Ele diz que assistir ao programa já faz parte de sua rotina matinal, e que gosta de ver o que está acontecendo na cidade sem “maquiagens”.


A dona de casa Djalmira Araújo, 48, diz que chega a passar mal quando assiste a programas do tipo. “Acho de extremo mau gosto, um desrespeito ao ser humano, uma banalização da vida. O pior é que eu sei que as pessoas dão o maior ibope pra isso, o que eu só tenho a lamentar”. Ela diz que outro dia em sua rua, um vizinho chamou o Bandeira 2 para ajudá-lo a procurar o seu cachorro pitbull que se perdeu. “Veja só o tamanho do absurdo”, comenta com indignação.


É cada vez mais latente a necessidade de mudança na forma de cobrir e divulgar esse cotidiano violento em que vivemos, para que possamos caminhar, aos poucos, como sugeriu o jornalista Fernando Molica, de uma cobertura policial para uma cobertura de segurança pública no Brasil.


Para o advogado criminalista Antonio Dias Feitosa, 59, programas policiais tendem a “esfriar” o cidadão, que acaba se tornando insensível à dor alheia, tornando-se esta, objeto de contemplação e até mesmo de entretenimento. “A exposição à violência na TV tem aumentado os níveis de agressão no telespectador. Eles aprendem a se comportar agressivamente a partir de observação de um modelo que é reforçado pelo seu comportamento agressivo, ou seja, se um programa que representa a delinqüência está consonante com a própria experiência do telespectador, um alto poder interativo poderá ocorrer”, argumenta.


A violência na mídia pode funcionar como compensação de carências em ambientes problemáticos e como fator de emoção onde não há problemas. Segundo o psicanalista Jorge Forbes, “querer ver mais, querer ver além da cena, não significa mostrar mais verdade, isso pode até chegar a ser obsceno, há um exagero claro nisso”.

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